Ela olha pela janela e percebe a
claridade evidente que emana através da vidraça embaçada pelo calor do seu
desespero constante. Depois de tanto tempo sem escrever uma palavra sequer, ela
volta a expor suas emoções em palavras e as mesmas jorram aos borbotões e seus
dedos não dão conta de expressar tudo que transparecem por meio delas. Sua inspiração
desaparece. Ela chora muito. Percebe que a vida a deixou amarga e sem
esperança. Ela observa a claridade advinda de fora e abre a janela. É como se
abrisse a janela para a vida, para as lembranças, para a saudade e o frescor da
noite bate em seu rosto. Ela fecha os olhos e relembra com lágrimas nos olhos
tudo o que já lhe ocorreu. Abre os olhos e vê a claridade da lua cheia no céu.
Não só a lua cheia, mas a última lua cheia do ano.
Ela lembra que não gosta dos finais de
ano, pois esses a deprimem mais ainda. Ela sempre está onde não gostaria de
estar, sendo extremamente simpática, quando o que mais quer é sair gritando,
para outro lugar, outro mundo, outras pessoas. Observando a lua cheia no céu,
ela pensa no que deixou para trás e pensa em estabelecer novas metas para o próximo
ano, mas percebe que essas serão praticamente infundadas, pois nunca consegue
realizar tudo aquilo que planeja, por mais ínfimo que seja.
O vento frio bate em sua face
lembrando-a de que ainda há esperança, mesmo que distante. Ela busca em seu
íntimo a força que a move e a encontra. Dois seres que dormem na calmaria da
noite, ressonando inocentes. O vento a acorda, pois ela já estava a cochilar
com os cotovelos doloridos a apoiar o rosto cansado nas mãos, e sente que seu
coração dói e a garganta arde com o choro preso.
Por fim, ela olha novamente a
majestosa lua iluminando a noite e lembra dele. Ele. Ele sempre foi uma grande
inspiração e ao mesmo tempo a sua dor mais profunda. Tantas pessoas já passaram
por sua vida, já teve muitos homens aos seus pés, e já se apaixonou por alguns
deles, mas ela sempre acreditou que amor existe somente um na vida e sempre
enfatizou isso. Por isso, ela crê com lágrimas nos olhos, que não será capaz de
amar novamente porque já amou intensamente uma vez na vida.
Ela resolve sair, abre a porta e senta
na grama molhada pelo orvalho da noite. Areja a alma com o vento e o frescor da
noite, e respira o ar puro que vem e está consciente de que jamais irá tê-lo
novamente. Ele é o homem dos seus sonhos, o príncipe encantado de toda mulher. Ela
nunca teve sorte com homens, pois sempre foi uma mulher muito carente,
sonhadora e que gosta de mimos e carinhos e nem todos estão dispostos a isso. Talvez
seja por não haver amor suficiente para tratá-la como merece. Sim! Como ela
merece, pois já batalhou muito e sofreu demais.
Talvez sofra demais porque tenta achar
em outros aquilo que só encontrou nele e isso a decepciona. Como foi seu único
amor ela está ciente de que jamais encontrará alguém que a satisfaça e que preencha as lacunas deixadas pelo sentimento que havia por ele. Eles amaram-se
intensamente, loucamente e eternamente! Ao menos era o que parecia. Ela percebe que mesmo sofrendo tanto,
chorando tanto, tudo valeu a pena e viveria tudo novamente se tivesse chance de
voltar no tempo.
Ela percebe que seu peito está
molhado, olha para cima achando que está chovendo, mas não é a chuva que cai, e
sim suas lágrimas de dor e desespero. Desespero por saber que em sentimento não
se manda, coração não se governa. Ela só gostaria que sua vida fosse simples,
sem pressa, sem vírgula, sem brigas, sem separação, sem mágoa, sem dor, e muito
menos ponto final.
Ela percebe que está ficando tarde, ao
ver que a lua está alta no céu, cada vez mais iluminada e esplendorosa. Suspira
fundo e adentra novamente. Observa uma última vez a lua e imagina se em algum
lugar no mundo, mais alguém estaria fazendo o mesmo. Talvez ele, depois de
tanto tempo ainda pode existir sentimento. Ela sabe que o marcou, assim como
ele a ela.
Escrever tornou-se uma fuga, pois ao
escrever o alívio vem e o peito respira altivo pronto para enfrentar a vida e o
que advém junto com ela. Ela coloca a cabeça no travesseiro, sentindo os olhos
inchados de tanto chorar e surge em meio as lágrimas um sorriso. Um sorriso de
esperança, de amor, de acalento, de descanso... E, por fim, adormece nos braços
da saudade, sonhando com seu eterno príncipe encantado!
Afinal, ela sabe que em algum lugar
ele também pensa nela, e por mais difícil que seja a vida, ela sabe que um dia já
foi plena de felicidade. A esperança ressurge como a fênix, fazendo-a acreditar
que outras luas cheias virão e que talvez tenha a sorte de reencontrá-lo numa
noite dessas de verão. Assim, nessa quietude, adormece sob a luz intensa da
última lua cheia do ano.